domingo, 22 de abril de 2012

A probabilidade da ressurreição de Cristo (com formulaz!!1!)

A um certo tempo atrás eu assisti o debate entre Bart Ehrman e Willian Lane Craig sobre a historicidade da ressurreição de Cristo, com o primeiro argumentando contra e o segundo obviamente argumentando a favor. Esse é um assunto de grande importância para Craig, visto que a historicidade da ressurreição é o único dos argumentos utilizados por Craig que defende a existência de um Deus cristão. Todos os outros  são apenas argumentos genéricos sobre a existência de algo com características presumidamente divinas.

De qualquer forma, um dos focos do debate (que é longo, porém recomendo) é sobre a colocação de Ehrman que, visto que a ressurreição de Cristo é um milagre e que milagres são eventos altamente improváveis, um historiador nunca poderia afirmar sobre a historicidade de um evento de ressurreição, uma vez que a única coisa que historiadores podem fazer é apontar qual narrativa histórica é mais plausível. Para refutar essa colocação, Craig introduz um argumento baseado no Teorema de Bayes para o cálculo de probabilidades colocando que, apesar de uma hipótese ser altamente improvável (no caso, um milagre), sua probabilidade final leva em conta outros fatores. Esses outros fatores, quando equacionados corretamente, levariam a conclusão que a ressurreição de Cristo é uma hipótese provável.


Visto que gosto de probabilidade e que apologetas tem um péssimo histórico de distorção de teorias científicas e filosóficas, abaixo exponho uma breve explicação do argumento de Craig e minha objeção  este argumento. Adicionalmente, ele é o cristão que todo ateu adora odiar, e eu não tenho nenhuma pretensão de ser original. Abaixo reproduzo da forma mais generosa que consigo o argumento de Craig e a seguir explico os motivos dele estar errado. Aviso: Formulas! Prossiga com cuidado.

O argumento Bayesiano para a ressurreição de Cristo

Segundo o Teorema de Bayes, a probabilidade de uma hipótese precisa ser avaliada em relação ao oque é chamado "conhecimento de fundo". Conhecimento de fundo é todo e qualquer conhecimento prévio que pode influenciar a estimativa da probabilidade de uma hipótese. Por exemplo, o recente registro de partículas mais velozes que a luz pode ser totalmente plausível se tomada por si só. Porém se levarmos em conta a teoria da relatividade de Einstein, que coloca que velocidades superiores seriam impossíveis, isso influencia a avaliação da probabilidade daquele registro. Assim, podemos considerar justificado o esforço dos pesquisadores em achar um eventual erro que levou aos registros, como de fato foi o caso. Dentro da teoria probabil'stica bayesiana, a probabilidade de acordo com o conhecimento de fundo de uma hipótese é


sendo R a hipótese da Ressurreição de Cristo e E as evidências disponíveis e Pr a probabilidade estimada levando em conta o conhecimento de fundo. Nesse caso Pr(R) é a probabilidade intrínseca da ressurreição (ou seja, a probabilidade de alguém ressuscitar), Pr(E) é a probabilidade intrínseca da existência das evidências (em outras palavras, a probabilidade de alguém afirmar positivamente que uma ressurreição ocorreu, seja a afirmação verdadeira ou falsa) e Pr(E:R) é a probabilidade de que alguém diria que uma ressurreição ocorreu, dado que essa ressurreição de fato é verdadeira. Craig usa a versão extendida da formula aplicável a casos onde existe uma dicotomia entre a hipótese e sua negação (no caso, ou Jesus ressuscitou ou ele não ressuscitou), onde Pr(E) é avaliado no contexto da hipótese da ressurreição de Cristo e na hipótese de que a ressurreição de Cristo não ocorreu:






O ponto de Craig é que Ehrman está errado em argumentar que a probabilidade da ressurreição é baixa (logo impossível de ser elegida como uma hipótese histórica válida), visto que ele está avaliando apenas a probabilidade intrínseca de alguém ressuscitar Pr(R), deixando de fora outros fatores, especificamente Pr(E:¬R). Segundo Craig, se tal probabilidade (que é a probabilidade de alguém afirmar positivamente que uma ressurreição ocorreu quando nenhuma ressurreição ocorreu) é demasiadamente baixa, a probabilidade da ressurreição será elevada. Para ilustrar isso Craig evidencia corretamente que a probabilidade Pr(R:E) pode assumir a seguinte forma:









com X=Pr(E:R)*Pr(R) e Y=Pr(E:¬R)*Pr(¬R). Se Y for pequeno o suficiente, a razão se aproximaria de X/X que é sempre 1, que significaria certeza total em R. Como Pr(E:¬R) compõem Y, então um Pr(E:¬R) baixo implicaria na aceitação da ressurreição de Cristo como uma hipótese histórica. Sendo assim, cabe ao cético demonstrar que existe uma hipótese naturalista que explique com sucesso as evidências de forma a tornar Y alto o suficiente para rejeitar R, e não apenas simplesmente apontar que a probabilidade (intrínseca) da ressurreição é baixa, como Ehrman fez.

Probabilidade pequena? E daí?

Então... onde exatamente Craig está errado? As possibilidades são diversas, mas a mais grave decorre de uma interpretação distorcida do que é uma probabilidade baixa. Para entender, vamos reiterar o argumento de Craig.

Para Craig, se o poder explicativo de uma hipótese naturalística é baixa (ou, se Pr(E:¬R) é baixa), isso implicaria que a probabilidade da hipótese de ressurreição, quando avaliada à luz das evidências (Pr(R:E)), é de quase 100% certa, não importando o quão baixa é a probabilidade da ressureição em si. Se isso parece estranho, é porque de fato é. Para ilustrar isso, basta desenhar a função Pr(R:E) para diversos valores de X (que inclui o poder explicativo da hipótese da ressurreição):


Fica, então, bastante evidente que o valor de X importa, e quanto menor for seu valor, menor terá que ser Y para que aceitemos a ressurreição de Cristo como uma hipótese provável. Em outras palavras, não basta apenas demonstrar que as hipóteses naturalísticas são ruins para explicar as "evidencias", mas sim que a hipótese supernatural é muito superior em poder explicativo e em probabilidade intrínseca, tarefa que dificilmente pode ser atingida apontando que não existe consenso sobre uma hipótese natural para as evidências.

No fim, nada disso difere significativamente de dizer "você não consegue explicar, logo Deus fez". Isso é Deus-das-lacunas, e igualmente falacioso. Nada além disso.

E acredito que esta seja uma avaliação bastante caridosa do argumento. Afinal, como naturalista, eu sequer acredito que a ressurreição é uma possibilidade lógica. Isso implica que, segundo o meu conhecimento de fundo, que é dado por biologia, física, medicina, etc, Pr(R)=0, o que implica que a probabilidade da ressurreição é sempre zero.

Craig de fato tenta abordar esta objeção, colocando que seus outros argumentos (Kalam, argumento Ontológico, etc) evidenciam a existência do supernatural e do divino e que, levando isto em conta como conhecimento de fundo, Pr(R) é diferente de zero, o que possibilita a ressurreição como uma hipótese válida. Entretanto, esses outros argumentos foram feitos de forma a serem consistentes com nosso conhecimento sobre a natureza. Inclusive, grande parte da fama de Craig vem do fato dele ter desenvolvido um argumento cosmológico que seria consistente com nosso conhecimento atual sobre cosmologia. Claro, esses argumentos são pura bobagem, mas mesmo se não fossem, eles não permitem a violação das leis naturais. Ou seja, Pr(R) ainda seria igual a zero. 

Um fato interessante desta argumentação é que, mesmo se fosse verdade, nós teríamos que primeiro aceitar a existência do supernatural e do divino, para depois considerar a ressurreição como plausível. Ou seja, o argumento apologético para a ressurreição de Cristo só funciona se você já aceita a existência de Deus. E é exatamente por esse motivo que argumentos apologéticos deste tipo não convencem um cético. 

7 comentários:

Acrescentando a propabilidade de Deus ser o criador do universo obrigatoriamente faz q a propabilidade da ressurreição não seja zero.
Matematicamente é impossível provar q foi Deus e impossível provar outra causa ou seja quem nega q seja Deus automaticamente assume q seja outra causa, mas se não sabe qual é essa causa logo tem q ter mais crença q um Cristão, pq o Cristão pelo menos sabe em que acredita e um ateu nem sabe em que acredita kkkk

Este comentário foi removido pelo autor.

Segue um trecho de um texto meu que refuta sua conclusão. Gostaria que me respondesse, se possível. Pode ser por email: jeanlucaspc@gmail.com

... Mas ainda tem mais uma objeção: a ressurreição é um milagre e milagres não existem. Existem outras versões desse problema como a ideia de que milagres são impossíveis ou muito improváveis, ou que não há evidência para milagres e eventos sobrenaturais, ou que essa explicação pressupõe Deus e requer que Deus seja provado para poder se sustentar, ou que a ressurreição quebra as leis naturais, entre outras afirmações. Isso leva a conclusão de que as explicações naturalistas, por mais improváveis que sejam, ainda são mais prováveis do que uma explicação que requer um milagre. Será mesmo que essa ideia está correta? Vamos analisar.

Não é possível afirmar que milagres não existem. A ciência não prova que tudo que existe é a matéria e energia que conhecemos, nem que Deus não existe, ou que o metafísico e o sobrenatural não existem. Não é necessário provar uma causa para afirmá-la como possível. Se a consequência é mensurável, qualquer causa pode ser colocada como uma possibilidade, desde de que ela não seja impossível ou provada falsa. Portando, não é necessário provar que Deus, ou o sobrenatural, ou o metafísico existem para afirmar a possibilidade de um milagre, basta que essas coisas não sejam impossíveis ou provadas falsas.

Um milagre não necessariamente quebra as leis naturais. Milagres podem ser ações externas que levam a um resultado que não seriam alcançados sem elas. É como no caso de uma doença, onde esta não seria curada sem uma intervenção externa de um médico ou um medicamento. Deus, ou alguma outra causa, pode ter usado meios naturais, desconhecidos pelo homem, que podem trazer um morto a vida. A ciência não descarta essa possibilidade e ainda trabalha para encontrá-la. Seria um milagre, na perspectiva humana, por ser algo considerado impossível para as pessoas até o momento.

Também não é possível afirmar que milagres são improváveis por natureza, pois é presumível que o autor tenha grande poder e capacidade, de forma que o uma ação miraculosa seja muito fácil para este. É presumível que, para um Deus criador do universo, seja muito fácil trazer um ser humano de volta a vida. Pode-se afirmar que os milagres são improváveis em relação aos acontecimentos gerais, mas não se pode afirmar que são intrinsecamente improváveis.

É possível concluir, então, que os milagres pode ser, de fato, improváveis dentro do escopo de acontecimentos gerais pois, se verificarmos as causas e consequências de ações e acontecimentos do dia a dia, possivelmente seríamos capazes de explicá-los de forma naturalista, sem apelo ao sobrenatural ou metafísico. Porém, isso não significa que algo além do natural não exista, pois a falta de evidência não é evidência de ausência. Por isso, não podemos afirmar que um milagre não é uma possibilidade a ser levada em conta em uma análise.

Por isso, aqueles que descartam o milagre como possibilidade o fazem de maneira errônea, partindo do pressuposto que não existe nada além da matéria e energia que conhecemos. Esse pressuposto infundado faz com que muitos descartem hipóteses que poderiam ser as verdades de um fato.

Voltando a cerne da questão, podemos afirmar que é mais provável que Jesus tenha ressuscitado ou que tenha acontecido outra coisa? Pela lógica dedutiva, a partir das evidências e argumentos apresentados, a melhor explicação é a ressurreição de Jesus. Mas ainda tem mais uma ferramenta que pode nos ajudar nessa análise, o Teorema de Bayes...

Aí continua no argumento do Craig.

Achei que você representou bem o argumento do Craig. Só discordo das suas premissas e conclusões em relação a possibilidade do milagre.

No texto completo eu falo das evidências históricas mostrando como são muito improváveis as hipóteses naturalistas. Sou engenheiro e também gosto de probabilidade. É indiscutível que a probabilidade de X precisa ser consideravelmente alta para que probabilidade da ressurreição também seja. Por isso é preciso levar em contra tudo que reflete nessa probabilidade, as deduções lógicas dos fatos históricos e os argumentos em relação a Deus. Uma coisa que você erra é em relação a conclusão sobre o Deus cristão. A prova do Deus cristão é a ressurreição, ela é a premissa dessa conclusão. Por isso, o que deve ser levado em conta é a probabilidade de um Deus genérico ter ressuscitado Jesus. Se depois da análise a ressurreição for mais provável, aí você pode concluir que esse Deus é quem Jesus falou sobre. Portanto, os argumentos em relação a existência de Deus corroboram para o conhecimento de fundo da equação.

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